Andava nas ruas esburacadas com seu carro importado, sabia que a luta da sua vida foi conquistada, agora tinha uma excelente condição de vida e uma empresa de grandes lucros. Vangloriava-se de sua sabedoria, era um senil de meia idade, sim, era mais sábio que muitos septuagenários. Todos o respeitavam, de modo quase submisso, era como se fosse um “deus dos negócios”, que trabalhava muito, esperando sua sexta década de vida para ser o “deus do ócio”. O trabalho lhe rendia muito tempo, e quando chegavam os dias de descanso, só fazia isso, descansava, nunca desperdiçava dinheiro com festas e afins. As únicas festas que ia eram aquelas de familiares, onde amigos da mesma casta se encontravam e falavam sobre as novidades do mercado. Enfim, tinha uma vida digna e que todos queriam que seus filhos seguissem. Tudo isso era o que eles pensavam, mas a verdade é outra. Seu trabalho excessivo lhe rendeu uma justa cara de um senil, sim, um ser decrépito, mais repugnante que qualquer criatura de qualquer conto de Lovecraft. Além disso, seu trabalho estressante o deixou mais rabugento do que um septuagenário descontente, desiludido, era tão rabugento que chegava a culpar os filhos e dar broncas por pura higiene mental, alívio neuronal. Sua mulher já lhe plantara tantos chifres que se podia reconhecê-lo até no escuro, entre um alce e ele, até seus “amigos” de casta já usufruíram dos clítoris da “Miss”. Seu carro já fora riscado e vandalizado várias vezes, suas casa era semanalmente pichada, o problema nem se resolveu quando contratou um segurança, a casa foi mais valorizada e as tentativas de piche eram tantas, que os seguranças começaram a ignorar. Se sentia o rei da cocada preta, mas na verdade era o ser mais odiado, decrépito, rabugento e desprezível do mundo. Resumindo, era só mais um burguês.
Gabriel Felippi
sábado, 31 de outubro de 2009
A "nóia" do muro
Carlos Saramago queria fugir da agitação urbana e foi para o campo, lá, comprou um terreno baldio de um velho que morava do lado. Construiu uma casinha de pau-a-pique e se instalou com sua mulher, Anna Maria Saramago e seus três filhos, Ruan e Josué Saramago e Antônia Maria Saramago. Carlos começou a trabalhar numa empresa de achocolatado perto da casa e também plantava uma horta para subsistência. Anna fazia produtos artesanais e toda sexta-feira dava-os para sua prima Soléia, que vendia na cidade. Os filhos estudavam também próximo da casa, numa pequena escola com 120 alunos. Os Saramagos tiveram mais quatro filhos. Thiago Saramago foi o primeiro que veio na nova casa, veio na noite de aniversário de casamento e a parteira foi a vizinha, mulher do velho que vendeu o terreno, nasceu no quarto e Anna o concebeu na cama, durante a lua cheia. O velho que vendeu o terreno, que se chamava Ilmo Schullz, faleceu de tuberculose. Morreu porque achava que a doença ainda não tinha cura como nos tempos do pai dele, que também morrera da mesma enfermidade, morreu sentado na cadeira de balanço, fumando seu cachimbo, vendo as crianças do vizinho brincando e esperando seu fado. O próximo que nasceu foi Ilmo Saramago, que nasceu na varanda de casa, quando Anna entregava os produtos à Soléia. A dor foi tanta que não conseguiu ir para o quarto e se deitou ali mesmo. Novamente a velha fez o parto com muito carinho. O garoto foi batizado com o nome Ilmo em homenagem ao velho que tanto ajudou à família, ajudando Carlos a conseguir o emprego na fábrica, ajudando a construir a casa e deixando pagar as prestações do terreno apenas nos meses que sobrava dinheiro. Depois veio Úrsula Maria Saramago que também nasceu na cama, mas dessa vez quem fez o parto foi o pai, pois não queriam acordar a velha as 3h da manhã. Por último veio Henrique Saramago, o único que deu avisos antes de nascer, dando tempo para ir ao hospital. Depois de cinco anos no campo, a família estava completa e a casa cheia, aliás, muito cheia. A velha parteira, que se chama Gertrudes Schullz, sempre ficava na casa dos vizinhos por três motivos, primeiro; odiava a “quase” solidão, pois à noite e às vezes ao dia, ainda podia-se ouvir o velho Ilmo balançando a cadeira na varanda onde morreu, segundo; eram os únicos vizinhos, e terceiro; o pouco tempo de vida que lhe restava serviria para alguma coisa, não queria morrer como o marido, sentada na varanda esperando seu dia chegar. De manhã Gertrudes ajudava no café e arrumava as crianças para ir à escola, quem não ia ficava brincando, vigiados pela velha que ficava sentada na cadeira de balanço conversando sobre o passado com o espectro de Ilmo, ajudava Úrsula a fazer o almoço e de tarde acontecia o mesmo de manhã, ficava vigiando as crianças da varanda, e a noite, colocava-os apara dormir. Voltava para casa, tomava um banho e ia dormir, essa era a rotina de Gertrudes. O tempo passou e os filhos cresceram, o mais velho tinha 20 e o mais novo tinha 13. Ruan, o mais velho, desejava ser técnico em eletrônica e se mudou para a cidade, lá alugou um apartamento e trabalhou num restaurante, pagou o curso com o próprio dinheiro. Josué foi trabalhar com o pai, mas em um setor diferente para o assunto família não atrapalhar os negócios. Antônia queria ser enfermeira e foi dividir o apartamento com o irmão na cidade, mas o curso foi pago com ajuda dos pais, pois o emprego que conseguiu mal dava para se sustentar. Thiago e os outros ainda estudavam e cada um tinha uma peculiaridade. Thiago sempre dava problema, amarrou bombinhas no gato e quase o matou e agora que era mais velho, tinha uma gangue com os amigos e sempre faziam arruaça. Ilmo era mais festeiro, Úrsula era muito mimada pelo pai e Henrique era muito quieto, gostava de ficar sentado no canto lendo seus livros. A velha Gertrudes se deu ao luxo de morrer dormindo sem sentir dor ou sofrer, morreu de velhice aos 85 anos de idade. Já havia se passado três anos e Ruan se casou com uma bela mulata chamada Clarice e foi morar com o sogro e a sogra. Josué construiu sua casinha de pau a pique no terreno que o pai cedeu para ele, casou-se com uma galega chama Sônia, que conheceu na igreja. Sônia era muito religiosa e odiava as festanças de domingo da família, achava que isso era uma ofensa à Deus e nunca participava. Thiago foi trabalhar na cidade e dividiu o aluguel com Antônia, que já havia terminado o curso e agora trabalhava no hospital. Ilmo também foi trabalhar na fábrica de achocolatado. Úrsula agora ia vender os produtos no centro, já que Soléia morreu dum câncer de mama e Henrique já decidira fazer direito quando arranjasse emprego. Depois de cinco anos tudo havia mudado. A casa de pau-a-pique agora era uma bela casa branca com um telhado de ponta construída com a ajuda dos filhos. Agora havia mias três casas além da casa de Josué. Ruan voltou com a mulher e fez sua casa, já que o sogro e a sogra faleceram num acidente de carro, Úrsula crescera e, contra a vontade do pai, casou-se e construiu sua casa com o marido. Henrique que queria ficar isolado no seu canto, fez sua casa e foi trabalhar na empresa de achocolatado, começou a fazer a faculdade de direito com a ajuda dos pais. Antônia foi obrigada a voltar ao colo dos pais, pois as encrencas de Thiago colocavam a integridade de Antônia em risco. Ruan abriu uma oficina que consertava aparelhos eletrônicos e eletrodomésticos, Úrsula era sustentada pelo marido, mas ajudava na padaria confeitando bolinhos, por isso, Anna parou de trabalhar, já que o marido agora era gerente e ganhava bem. Depois de muito tempo, quando Rique, como era chamado Henrique, já era advogado e Ruan era o mais bem de vida, mas o que mais trabalhava da família, Sônia se cansou das festanças e exigiu de Josué um muro. Se caso o marido não cumprisse a exigência, pedia a separação, pensão para os três filhos, ele não tinha saída e ergueu o muro. O próximo que entrou na onda do muro foi Henrique, que apesar de gostar das festas, queria mais sossego e se defendeu dizendo que o muro evitaria brigas familiares. Carlos e Anna sabiam que o efeito seria o oposto, mas não falaram nada, apenas tiveram uma postura adversa à ideia. Úrsula também mandou erguer o muro, pois sua inveja pelo irmão mais velho seria menor. Ruan não gostou da ideia, mas sua casa estava cercada de muros, só os fundos, que dava para à casa dos pais, não tinha muro. Ilmo também foi contra, dizendo que o espaço das festas iria diminuir, mas por causa da defesa, foi ignorado. Os pais então decidiram dividir o terreno para os filhos, como a casa deles ficava no meio, todos seriam vizinhos dos pais. Além dos terrenos já ocupados pelos quatro filhos, deixaram mais dois para Ilmo e Thiago, esse último, teve espaço, pois os pais ainda acreditavam que ele voltaria, Antônia iria sempre morar com os eles e iria trabalhar no posto de saúde do bairro. Numa tarde de quarta-feira, Anna recebeu a notícia de que Thiago foi morto por traficantes rivais, enterram-no num cemitério perto da casa dos Saramagos e deixaram o terreno de Thiago para Antônia, que tratou de erguer o muro antes mesmo de construir a casa, mas deixou os fundos exposto para sempre visitar os pais. Henrique casou-se com uma bela mulher que conheceu numa tarde de visitas à livraria. Antônia construiu a casa e dois meses depois encontrou um marido, marido esse que era muito gentil e sempre passava as horas vagas conversando com o sogro sobre futebol. Ilmo começou a exagerar nas festanças, além das festas familiares nos domingos que ia até as 8h da noite, saía depois com os amigos e só voltava de madrugada, mas também saia na sexta e no sábado, além dos feriados. Ele ainda morava com os pais, mas a situação ficou alarmante e Carlos falou que Ilmo tinha 6 meses para sais dali. Ilmo construiu a casa e lá ficou morando, agora todos tinham suas casas e durante algumas semanas, o muro foi de bom agrado aos filhos, mas os problemas começaram não muito tempo depois. Nas manhãs dos fins de semanas, havia lixo no terreno de Josué, lixo jogado pelos amigos de Ilmo, o único filho de Ruan, chamado Carlos, chutou a bola e caiu no terreno de Úrsula, que não devolveu ao garoto, Ruan foi falar com ela pessoalmente, os dois brigaram e no outro dia a bola estava no jardim de Ruan, murcha, com um corte feito com uma faca. Antônia certa vez veio bêbada com o marido de um jogo de futebol, e quando foram estacionar o carro, bateram levemente no muro. Foi o suficiente para derrubá-lo, mas para o lado de Rique, que derrubou a parede da sala, durante uma reunião que discutia sua entrada na OAB. As brigas apenas se intensificaram com o tempo, e o ódio familiar foi tanto, que os irmãos se separaram. Rique foi com a mulher para Curitiba, Úrsula foi com o marido de volta para Portugal para a casa do sogro, Antônia foi de volta para o centro, o aluguel era pago com o aluguel que recebia da antiga casa onde morava e com a economia de combustível do carro. Ruan comprou uma grande fazendo a 2km da casa dos pais, ele pediu para eles virem morar com ele, mas os pais negaram, a antiga casa de Ruan agora era ocupada pelos poucos empregados que tinha. Josué se separou de Sônia, ela foi morar com os pais e levou os filhos e também cobrou a pensão mensal. Ilmo faleceu dum câncer no estômago, a casa foi vendido muito barato para pagar a quimioterapia, mas não adiantou. Agora o terreno estava cheio de desconhecidos, todos eram pobres e em 2 anos, as casas, que não recebiam reformas, foram consideradas inabitáveis. Ruan pediu novamente para os pais voltarem, eles aceitaram com a condição de que Josué fosse junto e como os dois irmãos não tinham intrigas, ele aceitou. Josué ajudava na fazenda, ganhava casa, comida e tudo que precisava, em dinheiro, ganhava somente o suficiente para pagar a pensão aos filhos, que sempre o visitava nos fins de semana, brincavam com o pai e com o primo e ajudavam na fazenda. O espectro do casal de vizinhos, os velhos Schulls, ainda estavam sentados na varando, cada um nos suas respectivas cadeiras de balanço. Enquanto tricotava, olhando os escombros ainda em pé cercados por muros a velha disse:
— Como pode uma bela família acabar desse jeito?
— É, a campanha de Carlos começara num terreno baldio e terminara entre escombros demarcados com tijolos empilhados. — respondeu o velho depois de tragar o seu cachimbo.
Gabriel Felippi
— Como pode uma bela família acabar desse jeito?
— É, a campanha de Carlos começara num terreno baldio e terminara entre escombros demarcados com tijolos empilhados. — respondeu o velho depois de tragar o seu cachimbo.
Gabriel Felippi
A Eternidade Bicentenária
Dumbá, e seus amigos corriam e brincavam nas redondezas da aldeia, entre eles estava Wará, o melhor amigo de Dumbá e o rapaz mais belo da aldeia. Seria a última brincadeira de Wará, pois tomaria a água da maturidade e se tornaria adulto. Essa água na verdade é o sangue do Demônio da Morte, que antes de ser jogado no abismo pelo Deus Dragão Branco, foi ferido e seu sangue caiu no rio Tupindó, no qual ficou vermelho por toda a eternidade. Quando o rio ficou vermelho, os peixes morreram e todos acharam que morreriam de fome, mas descobriram que o fim do demônio da morte, trouxe-lhes a imortalidade. Não morriam nunca, nem quando ficavam apenas com a cabeça, como aconteceu com Xixunga, e muito menos morriam afogados ou queimados, a dor era intensa, mas não morriam, além disso, também nunca envelheciam. Depois que Wará tomasse a água da maturidade, seriam apenas três crianças na aldeia. Entre eles Dumbá, e os adultos agora já eram quase duzentos e o número de velhos beirava os cinquenta. Cada um tinha sua função na aldeia, os velhos ficavam com seus passatempos e uns ficavam inventando coisas, os adultos cuidavam da aldeia e também tinham seus passatempos e as crianças apenas brincavam. No outro dia, o ritual da maturidade que deixaria Wará, agora com aparência de doze anos, vinte anos mais velho, aparentando trinta e dois, foi normal, sem problemas, Wará estava mesmo decidido e não hesitou momento algum. Dançaram, cantaram e rezaram ao grande Deus Dragão Alado. Wará tomou a água e caiu em convulsões, os adultos, dançando com saias de palha e tranças no braços, além das máscaras de animais sagrados, cercaram-no sem pausar a dança. A dança era um cavar com os pés, levantando poeira, os corpos dos dançarinos inclinados para frente com os braços esticados e as mãos balançando sobre Wará, impossibilitava a visão da platéia, que via o círculo tremulante com espanto. Depois que os adulto voltaram a expandir o círculo e sem cessar a frenética dança, Wará já estava de pé, mais velho e dançando como se estivesse possuído, com os olhos cerrados, dançava com muito mais vigor que os outros e quando o Pagé deu o grito de encerramento da dança, Wará despencou inconsciente ao chão nomesmo instante. As mulheres pegaram-no e fizeram orações com ervas e chás, todas deram um grito em coro e Wará despertou. Agora já era mais um adulto, o quadragésimo terceiro a passar pelo ritual. Depois do encerramento do ritual, o Apache chamou todos no centro da vila e, do chão, falou para todos ouvirem:
— Hoje, faz duzentos anos que o Demônio da Morte foi jogado no abismo pelo Deus Dragão Alado e ficamos condenados a imortalidade. Digo “condenados”, pois nossa vida se tornou monótona e totalmente tediosa, perdemos o motivo de viver, não temos guerras pois nossos inimigos sabem que não morrermos, e se invadirmos, não haverá graça, já que eles apenas fugirão e não irão defender seus lares. Não temos nada para fazer, creio que minha missão foi completada quando ajudei Deus Dragão Alado à matar o Demônio da Morte. Se Tupã não quer me matar, eu mesmo faço isso! — o Apache pegou uma faca que estava na sua cintura e passou no próprio pescoço, algo que não ocorria à dois séculos aconteceu, o Apache caiu no chão morto, com o pescoço jorrando sangue e avermelhando a terra. Todos ficaram estupefatos, não houve nem sequer um suspiro, logo depois, os mais velhos fizeram a mesma coisa com a mesma faca. Um por um da aldeia repetiu o ato, sem pressa e com toda a calma da eternidade. Dumbá estava horrorizado e viu um por um cair na sua frente, uma pilha de corpo deixando toda a terra rubra, os suicídas agiam com naturalidade e frieza, como se os corpos deles estivessem possuídos por alguma entidade desconhecida. Foi a vez de Wará que agia do mesmo modo, Dumbá correu na direção dele em prantos, mas foi em vão, ele passou a faca no próprio pescoço e caiu. Então Dumbá correu para o canto, perto de uma oca, onde a terra ainda não ainda não estava rubro por causa do sangue. Ficou de joelhos, apoiando o ombro na parede e chorando. No ato suicida dos outros, ninguém gritava ou fazia som algum, ouvia-se apenas os passos lerdo e arrastados, como de zumbis, e o barulho que fazia-se quando alguém caia. Dumbá olhou para o chão que se ajoelhara e ao seu redor, tudo estava escarlate, olhou para trás e viu sua mãe, a última que ainda não caíra na pilha de corpos, abaixando-se para pegar a faca, ela observou por poucos segundo a faca ensanguentada, fitou o filho e passou a lâmina no próprio pescoço. Dumbá correu em direção ao corpo da mão que, no chão, ainda jorrava sangue, caiu de joelhos chorando como nunca chorou. Depois de alguns minutos, Dumbá ainda estava de joelhos ao lado do corpo da mãe, mas balançava o próprio corpo para frente e para trás, emitindo um grunhido constante e assustador. Sua boca aberta deixava cair saliva, e seus pescoço estava cortado, mas sangue não saia, os braços repousavam sobre as coxas nuas, com a faca na mão direita, ele estava inundado em insanidade. Porém, naquele lodo de demência que Dumbá caíra, uma frase se repetia de forma rítmica na mente dele, a frase dizia:
“... morrer é uma dádiva da vida... morrer é uma dádiva da vida...”
Gabriel Felippi
— Hoje, faz duzentos anos que o Demônio da Morte foi jogado no abismo pelo Deus Dragão Alado e ficamos condenados a imortalidade. Digo “condenados”, pois nossa vida se tornou monótona e totalmente tediosa, perdemos o motivo de viver, não temos guerras pois nossos inimigos sabem que não morrermos, e se invadirmos, não haverá graça, já que eles apenas fugirão e não irão defender seus lares. Não temos nada para fazer, creio que minha missão foi completada quando ajudei Deus Dragão Alado à matar o Demônio da Morte. Se Tupã não quer me matar, eu mesmo faço isso! — o Apache pegou uma faca que estava na sua cintura e passou no próprio pescoço, algo que não ocorria à dois séculos aconteceu, o Apache caiu no chão morto, com o pescoço jorrando sangue e avermelhando a terra. Todos ficaram estupefatos, não houve nem sequer um suspiro, logo depois, os mais velhos fizeram a mesma coisa com a mesma faca. Um por um da aldeia repetiu o ato, sem pressa e com toda a calma da eternidade. Dumbá estava horrorizado e viu um por um cair na sua frente, uma pilha de corpo deixando toda a terra rubra, os suicídas agiam com naturalidade e frieza, como se os corpos deles estivessem possuídos por alguma entidade desconhecida. Foi a vez de Wará que agia do mesmo modo, Dumbá correu na direção dele em prantos, mas foi em vão, ele passou a faca no próprio pescoço e caiu. Então Dumbá correu para o canto, perto de uma oca, onde a terra ainda não ainda não estava rubro por causa do sangue. Ficou de joelhos, apoiando o ombro na parede e chorando. No ato suicida dos outros, ninguém gritava ou fazia som algum, ouvia-se apenas os passos lerdo e arrastados, como de zumbis, e o barulho que fazia-se quando alguém caia. Dumbá olhou para o chão que se ajoelhara e ao seu redor, tudo estava escarlate, olhou para trás e viu sua mãe, a última que ainda não caíra na pilha de corpos, abaixando-se para pegar a faca, ela observou por poucos segundo a faca ensanguentada, fitou o filho e passou a lâmina no próprio pescoço. Dumbá correu em direção ao corpo da mão que, no chão, ainda jorrava sangue, caiu de joelhos chorando como nunca chorou. Depois de alguns minutos, Dumbá ainda estava de joelhos ao lado do corpo da mãe, mas balançava o próprio corpo para frente e para trás, emitindo um grunhido constante e assustador. Sua boca aberta deixava cair saliva, e seus pescoço estava cortado, mas sangue não saia, os braços repousavam sobre as coxas nuas, com a faca na mão direita, ele estava inundado em insanidade. Porém, naquele lodo de demência que Dumbá caíra, uma frase se repetia de forma rítmica na mente dele, a frase dizia:
“... morrer é uma dádiva da vida... morrer é uma dádiva da vida...”
Gabriel Felippi
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