segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Viagem ao Paraíso

Abriu o envelope e se assustou com o que viu, tinha ganhado o concurso e iria para Cuba. Saiu pulando pela rua e falando para todos que tinha ganhado, depois parou novamente em frente à caixa de correio e ficou girando com os braços erguidos, rodopiando e gritando, “Ganhei! Ganhei!”. Todos acharam que ele tinha ficado louco de vez, uns compreendiam e parabenizavam-no pela conquista, outros viravam a cara e saiam blasfemando. Entrou dentro de casa aos gritos, com o envelope ainda em mãos, o gato Felix se assustou e pulou a janela, se refugiando no alto muro dos fundos. Correu para arrumar a mala, quarta-feira não iria esperar, tinha que estar pronto, apenas 2 dias para se despedir de todos parece pouco, mas ele só tinha 3 amigos, seria rápido, e provavelmente, com uma festa. Pegou um papel e uma caneta e começou a escrever uma carta a irmã, falando tudo o que sempre quis falar, o que estava trancado na goela e nunca teve coragem de soltar a tona, escrevia rapidamente, mas mesmo assim era bem legível, e escrevia com grandes letras e várias vezes sublinhado nas palavras mais “sinceras”. Terminada a carta, guardou-a no bolso do casaco de flanela e foi pegar o ônibus, iria para a empresa na qual ganhava dois míseros salários para pedir a demissão e mandar a carta pelo correio para a irmã. Na empresa, mandou o patrão pra puta que o pariu e a carta foi mandada normalmente, sem nenhum acontecimento em especial. Ligou para os amigos dizendo que faria a festa na noite seguinte. O dia foi normal, viu pela ultima vez a cara do William Boner e da Fátima, assistiu o último capítulo de qualquer novela idiota da Globo e viu o último filme “desconstrutivo” da Tela Quente. No outro dia a festa foi grande, Henrique, João e o gato Felix fizeram a festa “bombar”. Obviamente Felix ficou num canto recluso, era o mais excluído do quarteto. A festa ainda teve direito a um Strip-Tease de João para uma atriz do filme Calígula, além de vômitos em todas as paredes da sala, ninguém se importava, a casa, que era alugada, iria ser abandonada do jeito que estaria, suja e sem o pagamento do mês. Também vendera algumas coisas para pagar a viagem até “Curita”. No outro dia, a ressaca foi pesada, os amigos, inclusive Felix, não estavam mais na casa, ele lembrava o que aconteceu na noite anterior. Comeu alguma coisa, tomou um banho, pegou as coisas, inclusive o dinheiro, e foi para o terminal rodoviário. Além da mala, tinha dois itens imprescindíveis que sempre levava, livros e um MP3 para ouvir suas músicas. Não iria se importar com o espanhol, escolheu o em vez do inglês quando criança e fez 5 anos de curso, além de ter um vocabulário culto por causa dos livros de autores cubanos que costumava ler. A viagem de 3h foi monótona, tirando as pastagens, nada mais belo na paisagem, além de ler na maioria do trajeto. Em Curitiba, almoçou em algum restaurante pequeno, aqueles com bufês de 3 reais. Foi para o aeroporto pegar o avião para Cuba. No começo achou estranho, pois não sabia que existia aeroporto em Cuba, mas não se importou. Na hora de passar pela revista, ficou quase tudo. O MP3, as roupas de marcas, que não eram muitas, os tênis, além da própria mala, trouxeram o que sobrou numa sacola de lixo. Ficou assustado, mais sabia que o governo daria o resto necessário. A viagem foi calma e quando desceu no aeroporto, viu que a cidade era muito pequena, de no máximo 20 mil habitantes. Um homem o esperava no aeroporto e lhe deu todas as informações, uma delas era nunca falar de Cuba e Fidel, ou Ruan, ou qualquer coisa que remetesse ao governo, pois isso seria prejudicial no seu alojamento. Deram-lhe uma pequena casa, um quarto, um banheiro, uma sala, cozinha e área de serviço, tudo com móveis rústicos e coisas simples. O começo disse que queria ir para Havana, mas convenceram-no a ficar na cidade, que se chamava Porto de los Chanchos. Ficou feliz em morar lá, ninguém conhecia nada de Rousseau, Nietzsche ou mesmo de Marx, mas não se importou muito, afinal, era o lugar perfeito. Claro que tinha seus problemas, às vezes o gás acabava e demorava cerca de 1 semana para vir um novo, mas os vizinhos amigáveis sempre sediam um pouco de fogo, mas às vezes tinha que se virar com fogueiras, coisa que fazia sem dificuldade, pois já fora um escoteiro. As roupas também era um problema, mas não se importava, nunca se importou com vaidade. Mulheres, nenhuma o atraia, iria sempre nas sextas-feiras para o "puteiro" pegar a que estiver disponível, tinha dias que tinha que esperar para que uma ficasse livre, chegou num dia no qual havia 2 homens na sua frente esperando pela primeira que saísse do quarto com um homem com as pernas bambas. Trabalhava numa pequena empresa que fazia peças com tornos rústicos, de má qualidade, em vez de problema, isso era positivo aos trabalhadores, pois quando a máquina estragava, ficavam sem trabalho, mas mesmo assim ganhavam. O que ganhavam não era dinheiro, mas “tickets” lazer, para aproveitar em alguma área de lazer da cidade, como bares, jogos, e claro, o "puteiro". Alguns problemas de abastecimento de alimento também assolavam a cidade, mas as matas densas disponibilizavam grandes caças. O problema foi quando certa vez, voltando do trabalho e gastando alguns “tickets” no bar, ouviu alguém falar de Hugo Chávez, e entrou na conversa, pedindo o que havia ocorrido com Chávez, responderam-lhe que ele não estava mais se preocupando com a cidade, e ele pediu o que o Chávez tem a ver com Cuba, e o homem, depois de dar uma gargalhada respondeu:
— Você também caiu no golpe, Tonito?! Você está na Venezuela, nunca mais sairá daqui! — gargalhadas estridentes ecoaram pelo bar.

Gabriel Felippi

3 comentários:

  1. nossa muito bom continueu assim!
    ja pensou em escrever um livro de contos vc tem talendo!

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  2. isso me parece meio intelectual, meio de esquerda :
    http://www.multiverso.net/?p=969

    Você já encontrou seu estilo, agora é só seguir,
    Parabéns!

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